Cirurgiões e barbeiros: curiosidades anatômicas da Idade Média.

28/07/2025 13:12

Você sabia que os primeiros cirurgiões/anatomistas eram classificados na mesma categoria que barbeiros?

Na Idade das Trevas, as práticas consideradas mecânicas eram colocadas no mesmo patamar. Ou seja, você poderia ser um cirurgião tentando curar alguém ou um barbeiro cuidando para não ferir seu cliente com a lâmina — e não haveria distinção na forma de interpretar essas atividades. Ambas eram consideradas parte das chamadas “artes mecânicas”.

Mas então os cirurgiões da Idade Média não eram considerados médicos?

A resposta é: não. Na antiguidade, os médicos eram chamados de “físicos” e se limitavam a observar e tratar enfermidades externas, sem entrar em contato com o interior do corpo dos pacientes. Além disso, os barbeiros também eram considerados cirurgiões, o que gerava uma mistura de profissões; assim, você poderia exercer ambas as funções sem que isso gerasse consequências éticas ou morais.

Isso acontecia porque, na Idade Média, os trabalhos manuais eram considerados inferiores aos trabalhos intelectuais — “limpos”, que não envolviam sangue nem carne — e, por isso, muito mais valorizados. Assim, havia um forte preconceito contra o estudo da anatomia, e o cirurgião/anatomista era frequentemente associado à figura da morte e às condições desagradáveis que ela implicava.

A mudança nesse cenário exigiu uma nova forma de interpretar as artes mecânicas no contexto da construção do conhecimento. No caso da anatomia, essa transformação começou com a publicação da obra De humani corporis fabrica, de Andreas Vesalius, em 1543, no século XVI. Suas ilustrações davam a impressão de movimento aos cadáveres, trazendo à anatomia o ar humanizado que até então lhe faltava. 

Além disso, Vesalius defendia a presença dos médicos na prática cirúrgica, acreditando que a separação entre as artes mecânicas e os trabalhos intelectuais havia causado um grande atraso às ciências médicas na Antiguidade. Somente em 1730, no século XVIII, na França, a cirurgia passou a ser reconhecida como uma “arte liberal e científica”, desvinculando os cirurgiões dos barbeiros, e abrindo espaço para o desenvolvimento da anatomia como ciência aplicada à saúde humana.

A segunda placa dos músculos, do Livro II do De humani corporis fabrica, 1543.

Referências do texto:

ABREU, Jean Luiz N. Os estudos anatômicos e cirúrgicos na medicina portuguesa do século XVIII. Revista da SBHC, v.5, n.2, p.149-158. 2007.

Instituto Ávila – Por que os cirurgiões eram chamados de Barbeiro?

Referência da imagem:

Meisterdruke – Andreas Vesalius